Ocupação Artística ‘Formas Múltiplas de Continuidade no Espaço’ é atração na Casa de Cultura Villa Maria

Artista visual Alexandre Mury propõe uma metanarrativa que questiona o papel da arte e da tecnologia na sociedade contemporânea

A Casa de Cultura Villa Maria, da UENF, recebe na próxima semana a inovadora ocupação artística “Formas Múltiplas de Continuidade no Espaço”, assinada pelo artista visual Alexandre Mury. Mais do que uma simples exposição de arte, a ocupação é uma metanarrativa complexa que desafia as percepções tradicionais sobre a criação artística, o uso da tecnologia e o papel do espectador. A exposição será realizada de 24/09 a 23/10/24, de segunda a sexta, das 9h30 às 17h30. Na segunda, 23/09, haverá a abertura da exposição para convidados, a partir das 19h.

Alexandre Mury

Com uma abordagem que subverte as expectativas e desconstroi as convenções, Mury conduz o espectador por uma experiência que vai além da superfície das obras expostas. Cada peça é parte de uma reflexão maior sobre a natureza da arte contemporânea, onde o que parece ser um exercício de criação assistida pela inteligência artificial revela-se uma ironia deliberada — um pastiche que expõe e questiona as práticas artísticas atuais.

“Formas Múltiplas de Continuidade no Espaço” exige do público um engajamento crítico e introspectivo, convidando-o a participar de uma narrativa que explora os limites entre o real e o virtual, o previsível e o imprevisível. O propósito não é facilitar interpretações, mas sim provocar uma reflexão profunda sobre o papel da arte no mundo contemporâneo e a capacidade humana de transcender o previsível

Natural de São Fidélis (RJ), Alexandre Mury é reconhecido por suas obras provocativas, propondo reflexões profundas sobre a continuidade no espaço, a relação entre espaço e tempo nos processos de criação e a efemeridade da arte. Com um trabalho já consolidado, Mury possui obras em importantes acervos como o do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM-Rio), Museu de Arte do Rio (MAR) e Museu da Fotografia Fortaleza (MFF), além de uma indicação ao Prêmio Pipa em 2016.

A exposição será uma oportunidade única de vivenciar peças instigantes, repletas de metanarrativas e técnicas diversas que estimulam a multissensorialidade. Como parte da programação, estão previstas mesas-redondas com professores universitários, encontros de formação com professores do ensino básico e visitas mediadas para estudantes.

“Luxo Efêmero” – Reflete a dualidade entre o valor duradouro do ouro e a natureza transitória do grafite

Para marcar o início da exposição, será realizada uma intervenção artística na noite dessa sexta-feira, 20/09/24, a partir das 19h. Durante a ação performática, o muro externo da Casa de Cultura Villa Maria será coberto com folhas de ouro. Segundo Mury, a obra não só serve como chamariz para a exposição, mas como uma verdadeira provocação sobre o que significa “grafite”, “autoria” e a própria ideia de valor artístico.

— A obra que estou criando com folhas de ouro representa, para mim, tanto uma ruptura quanto uma fusão simbólica entre tempos e contextos artísticos distintos. Colocar folhas de ouro em um muro externo, como parte de uma intervenção artística, provoca um diálogo entre tradição e contemporaneidade, levantando questões sobre a materialidade e o valor da arte — diz.

Segundo o artista, a obra desafia a relação entre o passado e o presente, entre a tradição e a insurgência. A intervenção subverte a técnica tradicional do grafite com a delicadeza e preciosidade da douração, propondo uma reflexão sobre o que significa criar arte no espaço público.

— A obra, por si só, é uma provocação: ela confronta o uso consagrado do ouro como símbolo de poder e permanência com a efemeridade e a transgressão do grafite, além de questionar o papel da arte urbana e sua relação com as instituições. Observada e fotografada durante sua criação, a obra também transforma o processo em uma ação performativa, onde o público é coautor na captura e disseminação da experiência — afirma.

Mury observa que o uso das folhas de ouro, um material que historicamente está associado à arte sacra, à nobreza e à preservação do sagrado, traz uma carga histórica intensa. A aplicação das folhas remete às antigas técnicas de douração, utilizadas desde a antiguidade para decorar igrejas, palácios e objetos sagrados, estabelecendo uma conexão imediata com o passado. Mas, ao transpor essa técnica para o contexto do grafite — que é, por natureza, efêmero, provocativo e muitas vezes marginalizado — o artista cria uma tensão simbólica. Esse gesto explora o conceito de ‘formas múltiplas de continuidade no espaço’, e vai além do físico, tocando no temporal da arte, onde o passado, presente e futuro se entrelaçam.

Obra desafia convenções do grafite

De acordo com Mury, a obra, tecnicamente, desafia as convenções do grafite. Enquanto o grafite tradicional geralmente envolve o uso de tinta spray e uma execução rápida e espontânea, neste caso essa expectativa é subvertida com o uso de folhas de ouro, uma técnica que exige precisão, paciência e cuidado.

— Essa escolha, é claro, não encaixa no que normalmente se entende por grafite, mas é proposital: provoca uma discussão sobre a definição de grafite e como ele pode ser parte da arte pública contemporânea. Em vez do spray, uso um material que pode ser considerado o oposto em termos de técnica e materialidade. É uma abordagem que vai contra o esperado, e, com isso, quero provocar uma reflexão sobre o que realmente define uma intervenção artística urbana — conclui.

Além disso, o fato de que esta intervenção recebeu autorização institucional para ser realizada, ao contrário da prática comum do grafite clandestino ou ilegal, adiciona uma camada extra de significado. Isso inverte a lógica tradicional do grafite como resistência ao sistema. Aqui, minha obra dialoga diretamente com a instituição. Ao trabalhar com um material tão nobre em um formato normalmente insurgente, eu provoco tanto os grafiteiros tradicionais quanto o sistema de arte institucional. O trabalho, nesse sentido, acaba sendo também um comentário sobre legitimação artística: quando e como uma intervenção urbana é reconhecida como arte?

— Por fim, há uma natureza performativa importante nessa ação. Convidei amigos e o público para observar e fotografar o processo, transformando o ato de criação em uma experiência coletiva, embora sem transformar a intervenção em uma performance propriamente dita. A ação performativa aqui se diferencia de uma performance tradicional, pois a obra em si é o grafite em folhas de ouro. O envolvimento e a documentação por parte dos outros estende a obra além de sua materialidade, para um campo de interação social e memória coletiva — conclui Mury.

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