Adeus a Gilca Wainstein, primeira presidente da Fenorte

Gilca Wainstein, ao lado de Darcy Ribeiro e Oscar Niemeyer, durante a implantação da UENF

“Uma universidade que será não só criadora, instigadora, mas irradiadora de uma nova mentalidade, de um novo pensar”. Desta forma, a professora Gilca Alves Wainstein referiu-se à UENF em uma entrevista concedida à Rede Manchete, quando ainda era presidente da Fenorte — antiga fundação mantenedora da Universidade, extinta em 2016. Falecida na última terça-feira, 09/09/25, aos 88 anos, em Campinas (SP), onde residia, Gilca deixa um legado de grande contribuição para a implementação da UENF no início da década de 1990.

Advogada, mestre em Administração, doutora em Direito e e pós-doutora em Direito Público pela Universidade de Paris, Gilca foi a primeira presidente da Fenorte, onde permaneceu de 07/04/1993 a 05/09/1996. Em entrevista concedida à Assessoria de Comunicação da UENF (ASCOM) por ocasião dos 20 anos da Universidade, completados em 2013, Gilca lembrou que foi convidada pessoalmente por Darcy Ribeiro para vir para Campos dos Goytacazes participar da implantação da UENF.

— Ele disse: é uma intimação. Você tem que vir para a gente fazer aquela universidade dos nossos sonhos. Vim para Campos em 1991, depois de conhecer vários modelos de universidades nos Estados Unidos — contou Gilca.

Na mesma entrevista, ela ressaltou a fundamental ajuda do então presidente da Fundenor, Rubens Venâncio, numa época em que a Universidade ainda não tinha sequer um local, mas já precisava funcionar.

— A Fundenor nos cedeu tudo: instalações, pessoal, laboratórios e, em troca, nós assumimos todos os gastos com os insumos básicos. Isso eu devo à Fundenor, pois sem ela a gente não teria como funcionar naquele momento — disse.

Gilca também relatou que nenhum dos professores trazidos para dar início à Universidade foram escolhidos pelo viés político, mas exclusivamente por mérito científico, citando nomes como Wanderley de Souza, Eugênio Lerner, Carlos Alberto Dias, entre outros.

— Eu tinha certeza de que a UENF, em pouco tempo, ía ser a melhor universidade do Brasil. Eu sabia que não seria possível superar a USP e Unicamp nas áreas em que elas são excepcionais, mas que isso seria possível nas outras áreas, como biologia e ciências da terra. A UENF tinha tudo para ser a melhor — afirmou.

Na entrevista à Rede Machete, Gilca referiu-se à UENF como a concretização de um sonho. Seu desejo era poder construir uma universidade que fosse realmente um fator de mudança social e econômica, e que pudesse ajudar a criar um novo país, no qual as pessoas resgatassem a sua dignidade através da educação.

— Meu desejo é ver essa universidade borbulhando de alunos, de pesquisadores inventivos, criativos, todos comungando o mesmo sonho. O conhecimento sendo transferido naturalmente, e permanentemente, de uma forma fervilhante, para seu parque de alta tecnologia, em alguns casos diretamente para o setor produtivo, ensejando, como se tem em vários lugares do mundo, um grande polo, um grande distrito industrial, onde existe interação entre indústria e universidade — afirmou.

E completou:

— O pensamento puro, pesquisa pura, casando com a pesquisa aplicada, onde você não divida nem homens nem a ciência, onde não diga que homens são pobres ou ricos, e onde você não diga que a ciência é pura, aplicada ou tecnológica. Onde você tenha a unidade, harmonia e as coisas aconteçam. Eu gostaria de ver essa universidade assim funcionando, viva, cheia de gente, cheia de esperanças e de realizações.

Veja depoimento do professor Nilton Rocha Leal, que atuou com Gilca na implantação da UENF:

A Dra. Gilca Wainstein atuava em Brasília, junto à PGR, quando o Darcy Ribeiro fez o convite para trabalhar na montagem de uma nova universidade: A Universidade do Terceiro Milênio. Em seus primórdios, se decidiu pela criação de uma Fundação, a Fenorte, da qual Gilca foi a primeira presidente.

A Fenorte serviu de base para a contratação de professores e auxiliares, na realidade, em sua maioria, com recursos da Faperj.

Gilca foi uma pessoa extremamente focada, muito dedicada, liderando de forma firme todos os participantes, inclusive o Darcy Ribeiro, tarefa não muito fácil.

Com seu entusiasmo e cultura elevada, foi moldando os caminhos da nova instituição.

As reuniões eram realizadas na sede da Secretaria Extraordinária, liderada pelo Darcy, na região da Mangueira, na Quinta da Boa Vista. A equipe inicial era constituída com professores e pesquisadores experientes, que apresentavam suas contribuições para a Dra Gilca, que tinha a função de aglutinar essas contribuições, o que fez com muita eficiência.

Fez diversas visitas a Campos, onde se decidiu por um local para abrigar a nova instituição, em um terreno de 50 ha, onde se extraia material para construção, cabendo convencer o prefeito da cidade, Garotinho, a desapropriar o local. Ao visitar a Prefeitura, juntamente com membros da equipe e Darcy convenceram o prefeito que cedesse aquele espaço, mudando o local da Prefeitura,o que foi de grande importância.

Depois de muitas reuniões na Quinta da Boa Vista, decidiu -se pela mudança para Campos, utilizando como base as instalações da Fundenor ,onde foram feitas adaptações para abrigar a Presidência da Fenorte.

Desse ponto, Gilca pôde acompanhar as atividade na área escolhida para sede do campus, onde o projeto do Oscar Niemeyer já se desenvolvia.

Assim, com a atuação de Gilca, foram sendo ajustadas as respectivas áreas na Fundenor, que teve ajustes de campo para o primeiro Centro da UENF, o CCTA, que utilizava galpões e salas para aulas.

A decisão de ter 4 Centros de pesquisa e ensino teve muito a participação da Dra Gilca. Foi uma experiência muito especial, pois a premissa da nova instituição era aprender e fazer,c om os centros atuando de forma forte e uniforme.

A UENF tinha um prazo constitucional para entrar em funcionamento, portanto a data de 16 de agosto atendia a essa demanda, quando foi inaugurada.

Os Centros estavam em Campos, todavia um laboratório de petróleo e gás foi localizado em Macaé, pela proximidade com a Petrobras ,mas deveria ter unidade também em Itaperuna e Itaocara. Desse imenso projeto — pois tudo tinha prazo limitado — a Dra Gilca esteve acompanhando de perto, oferecendo todo o suporte necessário. Fez várias palestras na região, divulgando a nova Universidade, e usou os jornais de Campos também para esse fim.

Como diretor do CCTA, eu tinha reuniões frequentes com a Presidente da Fenorte, da mesma forma que os demais diretores, e ela atendia a todos com muita atenção.

A contratação de pesquisadores do exterior teve o apoio e indicações, sempre que possível, especialmente na Área de Humanidades, onde tinha mais conhecimento, embora incentivasse com ênfase todos os setores.

Gilca tem seu nome gravado em cada espaço da UENF. Ela fez um trabalho brilhante, seguro, permitindo o desenvolvimento necessário para a demanda do projeto. A Universidade do Terceiro Milênio, com a Dra Gilca, Darcy, diretores, professores, auxiliares e estudantes dos variados níveis, graduação, mestrado, doutorado, todos atuando sob uma direção muito eficiente, permitiu que não houvesse interrupção, seja nas ações programáticas, cursos, obras em grande sequência, para no dia 16 de agosto de 1993, tivesse início essa nova instituição, que se mantém, com sucesso, até o presente, aos 32 anos de vida.

A lembrança de Gilca estará presente para sempre nessa instituição, na qual fez um de seus trabalhos mais dedicados.

Ficam as lembranças, nossa admiração, saudade e, acredito, agradecimento eterno, de todos que a conheceram.

Adeus, querida amiga.

(Jornalista: Fúlvia D’Alessandri – ASCOM/UENF)

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