Bolsista da Rádio UENF e aluno especial de Cognição e Linguagem lança nesta sexta-feira livro de estreia que utiliza ficção científica e fantasia para tratar de temas como racismo estrutural
Um livro que levou quase 20 anos para vir a prelo. Este é “Esconsos: O Mundo de Depois”, de autoria do bolsista do projeto de extensão Rádio UENF, Hugo Soares, que será lançado nesta sexta-feira (15/09), às 20 horas, na Casa Criativa Santa Paciência, na Rua Barão de Miracema, 81, Centro de Campos dos Goytacazes-RJ.
Multiartista, Hugo Soares formou-se em Jornalismo no Centro Universitário Fluminense (Uniflu) em 2008 e tem uma carreira também musical e de videomaker. Ele é aluno especial do mestrado em Cognição e Linguagem da UENF e repórter da Record TV interior RJ. Aos 40 anos, Hugo envereda agora pela área da literatura.
Ele conta que a ideia de escrever o livro começou nos anos 2004, 2005.
— De lá pra cá eu perdi parte do livro, reescrevi trechos e atualizei alguns conceitos nos últimos dois anos — conta.
As referências que o inspiraram a escrever o livro foram seus avós maternos, Reinaldo Emílio Soares e Cirena Pereira Soares. Quando vivos, eles tinham o costume de contar muitas histórias da região e da família.
— Hoje eu tenho a impressão que muito destas histórias fantásticas era um recurso pra transmitir os sofrimentos dos tempos da escravidão com um pouco menos de dor — considera Hugo.
O autor, ex-morador do bairro da Tapera, que significa “Casa Velha”, diz que o significado de “Esconsos” é “Escondido”.
— Mas o sentido popular antigo também fala de um espaço vazio entre duas partes que, caso não seja preenchido, gera desequilíbrio. A obra é bem isso mesmo — afirma Hugo.
Segundo ele, o livro foi selecionado para ser lançado nos dias 22, 23 e 24 de setembro de 2023 no Festival Doces Palavras, que será realizado no Quadrilátero Histórico de Campos. A ideia é fazer um outro lançamento na Lapa, na capital Rio de Janeiro, de onde é a editora Multifoco, que publicou o livro.
Hugo acredita que o livro vai ajudar o leitor a ampliar a visão daquilo que vê no cotidiano, mas que nem sempre consegue explicar com a lógica.
— Digo que “Esconsos” é uma alternativa à nossa realidade e isso quer dizer exercitar o pensar sobre futuros possíveis, já que a realidade à nossa volta nos poda tanto neste sentido — explica Hugo, anunciando que a obra faz parte de uma saga que terá mais dois volumes, formando uma trilogia.
Por fim, Hugo Soares, diz o que esperar do “Mundo de Depois”, que é tratado no seu livro e que, para ele, está chegando.
— “Esconsos – O Mundo de Depois” narra as incertezas de um deus para manter a humanidade no status quo. “O Mundo de Depois está chegando”. Que “O Mundo de Depois” seja construído a partir da empatia, que nenhum tipo de cultura se sobreponha a outra, no máximo, se misture como um bom drink.
Sinopse – “Isibukeli é uma figura mitológica conhecida desde o início dos tempos na África. Nessa alternativa à nossa realidade, ele é o responsável por manter o mundo girando e, para isso, cria as condições para que o desequilíbrio social entre ricos e pobres continue existindo. Tudo neste livro é uma metáfora. Dentro deste universo é possível perceber pilares sociais como o racismo estrutural, a mão humana que deturpa a religião, a manipulação das neuroses dos indivíduos, a política enquanto ferramenta de poder”, destaca o autor, que usa de forma sutil o cenário e a percepção dos manejos sociais de Campos dos Goytacazes, cidade em que nasceu e vive.
“Esconsos – O Mundo de Depois” tem texto de abertura escrito pelo também jornalista e escritor Felipe Sáles, autor do livro “O Azarão da Baixada da Égua”. A amizade entre os dois surgiu quando Felipe foi editor do RJ2 (Inter TV – Globo) e Hugo atuou como videorrepórter. Na introdução a essa realidade ele alerta que o leitor vai encontrar ficção científica, fantasia, espiritualidade, política e história, elementos a princípio díspares, mas que o autor consegue encaixar nesta obra que flerta como um gênero marcante na América do Sul, o realismo mágico.
— Eu me perguntei muito sobre em que gênero ou subgênero a obra se encaixaria depois que finalizei o livro. O escritor inglês Neil Gaiman é uma referência na criação de universos, Gabriel García Márquez na narrativa e análise social. Portanto, fantasia e realismo mágico são definitivos na minha escrita. Porém, após assistir uma entrevista com o escritor Fábio Kabral, eu me encontrei com a expressão afrofuturismo. Afrofuturista é uma forma de ver presente no futuro, na ficção científica, a cultura africana e diaspórica. O Mundo de depois em “Esconsos” é isso. Lá as pessoas e a cultura preta continuam vivas contra todas as estatísticas atuais, que apontam que um jovem preto morre a cada 15 minutos no país — analisa o escritor.
Esconsos é um quilombo que existiu em Campos dos Goytacazes, durante o período escravista e que ressurge nos tempos atuais do livro como uma alternativa evolutiva. Neste lugar as pessoas eram tão empáticas que conseguiam diversos feitos extraordinários, inclusive se comunicar como telepatas. O deus Isibukeli, que decidiu se chamar Tobias no Mundo de Agora, o presente da humanidade, manteve o planeta dividido entre norte e sul globais usando uma tecnologia conhecida como “Anjo da Guarda”. Por meio de uma pílula, quem tem recursos financeiros acredita tomar as melhores decisões baseando-se no que indicam os algoritmos. O deus quer usurpar Esconsos para manipulá-lo, já que acabaria com a necessidade da comunicação feita pelas redes sociais, por exemplo, destruindo o complexo jogo corporativista que domina este universo.