De Murundu para o mundo

Em uma história de muita resiliência, egresso de Ciência da Computação na UENF é contratado como analista de dados do IFood

Nos 30 anos da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF), uma história emocionante de luta, persistência e vitória. Bruno, filho de Carlos Augusto e Lúcia Helena, nasceu há 27 anos, quando a UENF ainda era uma criança. Com cinco anos de idade, seus pais tiveram de deixá-lo com a avó Maria Aparecida, ex-cortadora de cana e analfabeta, e foram para Tamoios, Cabo Frio, trabalhar em uma usina. O pai de Bruno sofreu uma fratura exposta na perna e decidiu voltar com a esposa para a localidade de Murundu, na região Norte do município de Campos dos Goytacazes, onde a família morava antes. Bruno tem uma irmã mais velha, Monique, que é técnica de enfermagem.

Há um ano, Bruno Palmeira de Oliveira trabalha como analista de dados do iFood. Ele entrou na empresa como júnior e foi promovido a pleno. O trabalho dele no iFood é identificar gaps logísticos para melhorar a performance de operação logística e aprimorar e otimizar o desempenho geral da operação logística da empresa.

A família de Bruno vivia muitas dificuldades, com a mãe trabalhando de auxiliar de serviços gerais. Aos 10 anos de idade, Bruno ganhou um computador da avó materna Maria Aparecida, que era merendeira de uma escola. O garoto começou a gostar de utilizar o computador mesmo sem internet. A paixão pela tecnologia o levaria mais tarde a um futuro promissor. Mas primeiro Bruno teria de terminar o ensino fundamental no Colégio Estadual Baltazar Carneiro, em Cardoso Moreira. No ensino médio, ele foi cursar o técnico em Mecânica no IFF e o curso de Petróleo e Gás no Senai. Só depois então, ele ingressaria no curso de Ciência da Computação da UENF. Enquanto estudava na UENF, Bruno estagiava à noite no IFF na manutenção de computadores e fazia curso de Inglês aos sábados no Instituto Brasil Estados Unidos (IBEU) Campos. 

A mãe de Bruno, dona Lúcia Helena, conta que o filho acordava bem cedo para estudar, chegava em casa após um dia de estudos e estágio e ainda ficava estudando até de madrugada.

— Eu ficava pensando: que horas este menino vai dormir se ele tem de acordar cedo amanhã? Ele saía de casa às 5 horas da manhã e chegava às 9 horas da noite. A gente sempre batalhou para dar um respaldo para o Bruno. Ele disse que queria estudar, e nós dissemos: nós vamos te ajudar. E ele conseguiu, chegou a este patamar. Mostrou que é possível. Tudo fruto daqui da UENF. Espero que os governos mantenham esta universidade — disse Lúcia Helena, emocionada.

O pai de Bruno, senhor Carlos Augusto, também se emocionou ao lembrar do passado sofrido da família.

— Olho para trás, vejo tudo que eu passei e fico feliz. Foi muito choro. Para a gente que é preto, pobre e da roça, a UENF é uma oportunidade muito grande de melhoria das condições financeiras e de vida. A gente morava no interior, em Murundu, eu recebi uma indenização e comprei uma casinha na Codin. A gente viveu muita pobreza e ainda é pobre. Mas agora o Bruno está nos dando uma condição melhor. Fui até pela primeira vez ao cinema — contou Carlos Augusto, que é motorista de ônibus da linha que passa em frente à UENF.

Carlos Augusto tinha vindo com a esposa Lúcia Helena na UENF para a formatura do filho em março de 2023. Na quarta-feira (30/08), eles voltaram à Universidade, onde o filho se reencontrou com a professora Anabel Del Real Tamariz, que Lúcia Helena considerou ter sido uma mãe para Bruno. Lúcia Helena agradeceu muito por tudo que Anabel fez pelo filho dela e deu um abraço apertado na professora. Anabel fez questão de elogiar o ex-aluno.

— Seu filho merece. Ele entrou na UENF por um sistema democrático de cotas, estudou e abriu o caminho dele. O papel da UENF é este, de dar as oportunidades. E o Bruno foi este estudante que soube aproveitar a oportunidade que a Universidade deu. A gente costuma dizer: enche sua mochila, que o conhecimento ninguém tira de você — disse Anabel, que é chefe do Laboratório de Ciências Matemáticas (LCMAT) da UENF. Bruno também encontrou com colegas de sala de aula, dentre eles o Ralf, que ingressou na mesma turma que ele, de Ciência da Computação.

Analisando sua trajetória, Bruno considera difícil para pessoas “pretas e periféricas” chegar onde chegou. Na sua opinião, por mais que a universidade seja pública, o ensino integral é elitista.

— Porém a UENF me ajudou muito com a bolsa cota e o Restaurante Universitário. Se eu não tivesse o amparo da UENF, eu seria mais um caso de evasão. Minha mãe perdeu o emprego de auxiliar de serviços gerais e, às vezes, eu passava o dia só com o dinheiro do lanche e do ônibus — lembrou Bruno, emocionado.

Ele conta que quis estudar na UENF porque é uma Universidade com uma boa imagem. Sua rotina era acordar cedo e estudar até de madrugada.

— E valeu a pena. Hoje, nós, pretos e periféricos, estamos ocupando nossos espaços, que nos foram negados. Espero que isso também aconteça com outras pessoas como eu. A universidade é para todos. Existem muitos jovens que precisam estar aqui, e isso é possível. Não é uma vitória individual, é uma vitória coletiva — ressaltou Bruno.

Para ele, o curso de Ciência da Computação continuará a ser muito valorizado no futuro, devido ao boom de tecnologia. Dando continuidade a seus estudos, Bruno ingressou no segundo semestre de 2023 em um MBA de Análise de Dados e Big Data, financiado pelo iFood.

— Gostaria profundamente de expressar minha gratidão à minha avó. Mesmo tendo enfrentado a negação de acesso à educação devido ao contexto social em que ela estava inserida na época, ela sempre enxergou a educação como uma oportunidade de transformação social. Ela me incentivava, tanto financeiramente quanto com palavras de encorajamento, a buscar os estudos com determinação — concluiu.

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